sexta-feira, 18 de setembro de 2009

O aniversário.

Sábado. Aniversário de uma amiga de longa data. Ela resolveu comemorar num pub no centro da cidade (já falei que gosto de pubs?).
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Bem, como usualmente acontece nos finais de semana, um inferno. Consigo entrar na casa depois de meia hora na fila (fala sério, é uma estratégia da casa, não? Aquela fila na porta dá impressão de que a casa está “bombando” para quem passa de fora!)
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A primeira coisa que eu faço é ir ao balcão e pedir uma garrafinha de cerveja “long neck” (noite quente e eu estava com sede depois da longa espera). Depois de rodar um pouco, localizo minha amiga (e aniversariante). Alguns presentes, beijos e sorrisos depois, ela me apresenta uma amiga com quem ela estava conversando. Fernanda era seu nome e ela tinha chegado de Londres recentemente para morar na cidade. A aniversariante pede desculpas e se retira para cumprimentar outros convidados, nos deixando a vontade para conversar.
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- E ai? Está gostando da cidade? Pergunto.
- Ah, é diferente de Londres, né? Mas é muito bom estar de volta!
- Mas você está trabalhando já?
- Sim, estou trabalhando em um banco, e você, o que faz?
- Ah trabalho para no XXX (Ah, não dá para revelar aqui onde trabalho, né? Além disso, acho que não é importante para a história!)
- O que? Você trabalha no XXX? Gente!! Eu estava louca para conhecer alguém que trabalhasse lá... (Ela me pareceu extremamente animada, seus olhinhos brilhavam! Fiquei preocupado.)
- Bem... er.. hum.. você acaba de encontrar então (respondi desconcertado e pronto para fugir. Aquela reação entusiasmada não poderia ser um bom sinal).
- Sabe o que é, eu conheci um rapaz que trabalha lá... Fábio. Você conhece um Fábio que trabalha lá?
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Coincidência ou não, eu conhecia um Fabio que trabalhava lá. O Fabio era uma figura. Afetadíssima. Era o melhor amigo das meninas do escritório e adorava fofocar no fim da tarde com o grupinho da “pausa para o café”.
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Lembro em uma oportunidade, quando as meninas conversavam sobre ir para um motel com um cara que conheceram na mesma noite. A opinião delas se dividia. Umas concordavam, outras criticavam. Não havia consenso (É claro, eu nem estava prestando atenção nesse fuzuê todo. Estava distante, trabalhando arduamente. Sou um profissional dedicado).
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Quando o Fabio entra na sala, as meninas o cercam e pergunta o que ele achava de no primeiro encontro com “qualquer um”. O Fabio levantou os olhos para cima, fez uma cara de nojo, apontou o dedo para uma das meninas e corrigiu:
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- Com qualquer uma não, querida. COM UMA MULHER!.
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A sala foi tomada por um silencio sepulcral que só foi interrompido pela risada espalhafatosa e quase histérica do Fábio.
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O que foi estranho na resposta dele, não foi o trejeito escandaloso e afetado. Foi a necessidade do complemento para alguém que está se fazendo passar por hetero. Imaginemos, por exemplo, dois amigos heterossexuais conversando:
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Amigo 1: - E ai camarada, o que você fez ontem?
Amigo 2: - Ah velho, nem te falo. Sai, bebi todas e terminei minha noite em um motel... COM UMA MULHER!!
Amigo 1: - NUUUSSA! QUE DIFERENTE VOCÊ!
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Questão: O complemento na resposta do amigo 2, é necessário ou suspeito?
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De volta a festa. Era essa pessoa que me veio a mente quando ela perguntou se eu conhecia um Fabio.
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De qualquer forma, ela se entusiasmou:
- Sério? Um moreno, alto de cabelos enroladinhos e olhos verdes?
- Bem, o Fabio que eu conheço é assim.
- Com sotaque bem forte do sul? Que passou agora em um concurso público?
- Humm.. É.. Parece ser ele mesmo.
- Ele mora com uns amigos e tem um carro azul?
- Olha, o Fabio que eu conheço acho que mora sim com uns amigos. Só pode ser ele.
Num suspiro ela se entrega:
- Ai, eu acho aquele homem tudo de bom! Sensível, educado, inteligente, bonito – (talvez sensível demais? pensei...)
Eu não resisto e deixo escapar um sorriso maldoso:
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- Olha Fê. Na boa, eu acho que esse cara não é para teu bico não, viu! (sorrindo)
- Hã? E porque não, posso saber? Ela pergunta indignada, arqueando uma das sobrancelhas, e cruzando os braços.
- Ué. Porque ele é GAY! Respondo com naturalidade:
- Hã? Gay? Não é não!
– E como você sabe que ele não é Fe? - levo à garrafa a boca e sorvo um gole da cerveja.
- Por que? Bem, porque ele é meu namorado!
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O tempo pára e eu fico paralisado. Foi o som auto ou eu ouvi ela dizer que o Fabio é o namorado dela? Não tiro a garrafa de cerveja da boca.
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O tempo volta ao ritmo normal. Olho para ela (mantendo a cerveja no mesmo lugar, tentando ganhar tempo). Não sei o que dizer. Ela aguarda ansiosamente. Parece um pequinês com os olhões vidrados esperando um pedaço de carne. Uma gota de suor escorre pela minha face.
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Outro gole na “long neck”. Ela desce amarga, quente e lentamente. A cerveja, que já estava na metade quando começamos a conversar, acabou por render cerca de 42 minutos (um novo recorde para se beber uma garrafa de 355mls). Eu desisto de tentar lamber o conteúdo da garrafa vazia (até porque estava com câimbra no pescoço) e decido encarar a fera.
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Bem, para resumir, o resto da noite a partir desse acontecimento foi horrível. Para onde eu ia, ela me seguia. Consegui perde-la quando fui ao banheiro. Mas descobri que ela estava esperando na porta ao sair, só para continuar saraivada de perguntas.
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Não é que ela tenha ficado com raiva. Ela parecia estar até conformada. Senti que ela percebeu várias características que a incomodavam. Mas ela queria ter certeza de que não era uma impressão. E eu e minha boca grande acabamos sendo a comprovação que ela tinha medo. E assim, lá estava ela, me seguindo pela casa e me perguntando porque eu achava que ele fosse gay e se eu sabia de alguma coisa?. Eu tentei dar uma desculpa qualquer (eu confundi. Ele só é muito... educado!). Não sei porque, mas não a convenci.
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Bem, toda essa experiência me ensinou 3 valiosas lições:
1) Não se deve julgar um livro pela capa;
2) Quem fala demais dá bom dia a cavalo e;
3) Terminar um texto desses com 2 ditos populares batidos é muita falta de criatividade.
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Mas eu quero mudar. Para nunca mais cair nessas situações que eu mesmo acabo me colocando, eu resolvi fazer um curso de surdo e mudo. Mas a coisa não anda bem. Sempre acabo batendo boca com o professor, sei lá, ele parece que não me dá ouvidos! (Turum-tissss).
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Para finalizar, semanas depois fiquei sabendo que o Fábio terminou com a Fernanda. Foi morar em Berlim com um amigo cabelereiro. Boa sorte Fábio!