quinta-feira, 3 de abril de 2008

O velho louco...

Um fim de semana ensolarado com uma leve brisa gélida. Era fim de outubro, decidimos eu, minha namorada e um casal de amigos, passar o fim de semana em Caldas Novas, cerca de 300 km de Brasília. Fomos todos em meu carro. Saímos na sexta direto do trabalho, por volta das 16:00hs. Estrada vazia e paisagem monótona como é típica de cerrado. O cerrado na verdade, tem um tipo de paisagem curiosa. Eu acho que é possível pintar um quadro enquanto se dirige porque durante toda a viagem o cenário não muda. (vou tentar isso um dia).
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Estavamos no horário de verão e a tarde demorava mais a passar. O som alegre de Cake - "Fashion Nugget", vibrava nos alto falantes, embalando nossa percurso enquanto assistíamos a lenta descida do sol. O céu limpo e sem nuvens oscilava entre as cores vermelho, o laranja e o rosa (viu, eu disse que devia ter levado pincel e tinta). As sombras das árvores tomavam dimensões gigantescas, enquanto todo o resto do cenário tinha um tom alaranjado.
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Em determinado momento da viagem, minha namorada reclamou que sentia sede e coincidentemente, eu começava a sentir uma leve pressão na bexiga. Seria bom uma parada para esticar as pernas e relaxar, afinal, ninguém ali estava com pressa mesmo. Paramos num posto de beira de estrada. Simples, todo pintado em um tom de verde suave. Parecia ser limpo e organizado. Desci do carro para ir ao banheiro enquanto minha namorada foi comprar algo para beliscar. Nossos amigos ficaram no carro .
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Na entrada da lanchonete, percebi que do lado de fora havia um senhor idoso, gordo, de barba falha e branca e de feições rosadas, que resmungava sozinho entre as moscas que passavam por sua cabeça. Se estivesse de vermelho, eu o confundiria com Papai Noel. Apesar do clima agradável que fazia aquela tarde, o velho usava um paletó cinza, bastante sujo e um quepe preto. Sua barba branca/amarelada, curta, e cheia de falhas, parecia ter sido cortada a tesoura. Possivelmente, um parente do dono da lanchonete, já completamente senil que, para o agrado da família, foi "contratado" como segurança do restaurante, pensei.
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No interior da lanchonete, que mais parecia um mini mercado, havia várias prateleiras de salgadinhos e doces, o que dificultava a visualização de uma placa que indicasse os banheiros. Nada. Percebi que o garçom, um garoto com não mais que 17 anos, vinha apressadamente na minha direção carregando uma bandeja de alumínio com uma cerveja em uma das mãos levantas na altura da sua cabeça.
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Pensei em pedir uma orientação, mas antes que pudesse terminar o "Por favor", o moleque passou do meu lado sem nem ao menos perceber minha existência. "Que falta de respeito!", pensei. De repente, o velho de quepe levanta o braço e grita com uma voz rouca: -"ÔU"!. Percebi que ele tentava fazer contato comigo. Possivelmente queria pedir dinheiro ou algo assim. Fingi que não vi. Se tem uma coisa que eu aprendi é evitar contato visual com loucos.
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O Garçom já estava voltando. Talvez ele não tivesse percebido. Mais enfático dessa vez eu disse "- Ô Amigo, eu..", e mais uma vez ele passou por mim, antes que eu chegasse ao meio da frase, sem ao menos me notar. Mais uma vez ouvi o grito rouco: - "OOOU!!", o velho na mesa agora agitado, balançava os dois braços freneticamente (como se antes não fosse suficiente). Mais uma vez desviei o olhar. "Só pode ser brincadeira!". Procurei as câmeras para me certificar de que não era uma daquelas pegadinhas. "Ou talvez eu esteja em um daqueles filmes de terror em que o personagem principal não se deu conta ainda de que ele já morreu e agora é um fantasma e ninguém pode vê-lo?". Enquanto eu elaborava uma teoria que fosse coerente, o velho continuava gesticulando. Passei por um espelho e vi o meu reflexo, então morto eu não estava. "Mas que falta de educação desse povo". Fui até o caixa, puto, e perguntei ao rapaz onde seria o banheiro. Ele indicou e fui lá resolver meu problema.
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Na saída, peguei uns pacotes de doritos e algumas garrafas de água e seguia em direção ao carro. Ao ver o Garçom fechei a cara. (Devia ter reclamado dele para o Gerente, isso é jeito de tratar um cliente?) Fui em direção ao carro, e lá estava o louco de novo que, ao meu ver, ficou todo agitado: - ÔUU! ÔUUU! ÔU Moço! "Deus! Mal posso esperar pra sair daqui", pensei.
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Ao passar na frente do velho, já nervoso, ele grita mais uma vez. Mas dessa vez, diz algo que me fez parar por um segundo assim que o meu cérebro processou a informação. Ainda assim continuei andando firme na direção do carro, sem ao menos olhar para os lados e totalmente constrangido. Como no final de um filme de mistério, agora as peças se encaixavam. O desfecho final. O clímax da história. As palavras do velho louco vão ecoar pra sempre em minha mente: "Ele é surdo!" Gritava o velho louco... (Tchan – Tchan - Tchaaaannnn!!)
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Entrei no carro, sem dizer uma palavra. Liguei o motor e percebi que quase já não havia oxigênio no veículo. Minha namorada e meus amigos haviam consumido todo o ar de tanto rir. Aumentei o som tentando abafar o som dos risos, enquanto seguia viagem.

2 comentários:

Eliezer disse...

Eron, algumas pessoas tem o dom de ter uma defesa natural q as impede de te ver... um dom raro, mas mto útil heheheh

Mari Dourado disse...

aaaaaaaaaaa eu gostei da história... hahahah só tu mesmo...


beijos